📌 Entenda a taxação dos livros e seus impactos
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Olar, bookstans de plantão, tudo bem com vocês? O assunto de hoje não é voltado para o entretenimento de vocês, mas é uma questão séria que tem que ser analisada e debatida. Esses dias estive concentrada em outras coisas e acabei atrasando o post. Entretanto, aqui estou para falar acerca da reforma tributária e seus possíveis efeitos no que diz respeito exclusivamente ao assunto preferido desse blog: livros.
O Projeto de Lei nº 3.887/2020 que está em trâmite na Câmara dos Deputados, visa propor uma reforma do sistema tributário nacional, reconhecidamente necessária. Contudo, a primeira parte da reforma, apresentada em 22 de Julho ao Congresso Nacional, trouxe a tona a possibilidade de efetuar a tributação dos livros.
Historicamente, desde a Constituição Democrática de 1946, após uma emenda constitucional proposta pelo escritor e até então Deputado Jorge Amado, o papel utilizado na impressão de livros, jornais e revistas era isento de impostos. Consagrou-se, assim, o regime de isenção para esses materiais. Posteriormente, a Constituição Federal de 1988 consolidou em seu art. 150, inciso VI, alínea “d”, a vedação à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios de instituir impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. Por fim, surgiram as contribuições sociais (PIS/PASEP e Cofins, p. ex.) que recairiam sobre o faturamento das empresas e claramente impactaria na venda dos livros. Com isso, a Lei nº 10.865/2004 veio para isentar os livros, em sua totalidade, da incidência de tais impostos (PIS/PASEP e Cofins), possibilitando a diminuição no valor final dos mesmos.
Diante disso, vamos lá entender o que mudaria em relação aos livros se a reforma fosse aprovada da forma como foi proposta (o que eu duvido que ocorra e assim espero). A taxação dos livros seria feita através da unificação dos tributos federais sobre o consumo, que são, justamente, o Programas de Integração Social (PIS), Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Estes seriam substituídos pela criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS) que teria uma alíquota de 12%, tornando-se a nova forma de tributar o consumo e acabar com a cumulação de tributos. O problema é que com isso não mais seria aplicável a isenção determinada pela Lei nº 10.865/2004, exclusiva para PIS e Cofins, resultando na incidência da taxa de 12% sobre os livros.
Disso decorre que, obviamente, o valor do livro aumentaria para o consumidor final (ficando mais caro do que já é), já que essa taxação afetaria toda a cadeia de produção editorial, desde o fabricante de papel até o varejista, e o preço tem que ser repassado para alguém. Sendo assim, os editores estimam que os livros fiquem 20% mais caro. Como consequência, o acesso aos livros seria ainda mais dificultado e a leitura desestimulada, ainda mais em um país que tem como média de leitura 2,43 livros por ano por pessoa, sendo que 44% dos brasileiros sequer leram algum livro. Além disso, haveria um desestímulo também para a produção editorial, levando para o buraco as livrarias independentes e familiares e as pequenas editoras, que já sobrevivem com dificuldades, sendo estas agravadas pela pandemia. Some-se a isso o fato do mercado editorial está em crise faz anos, tendo encolhido 20% entre 2006 e 2019. O ápice dessa crise foi em 2018, quando as gigantes do mercado, as livrarias Saraiva e Cultura, entraram com pedido de recuperação judicial e fecharam as portas em diversas cidades do Brasil.
Ademais, após diversas quedas no setor editorial como um todo no início da pandemia, este teve uma pequena recuperação em Julho e a instituição dessa taxa o levaria a mais uma crise sem precedentes, desestimulando a produção de novos títulos, diminuindo a diversidades dos produtos disponibilizados e a própria receita das editoras, podendo resultar no fechamento de diversas delas. Um dado ainda mais curioso é que a média de direitos autorais pagos ao autor de um livro é de 10%, ou seja, o governo ganharia mais que o próprio autor.
Segundo levantamento feito pela consultoria Nielsen Book, coordenada pela CBL (Câmara Brasileira do Livro) e pelo Snel (Sindicato Nacional dos Editores de Livro), em 2019 foram produzidos 395 milhões de livros físicos, sendo 47,5% destes livros didáticos e 18,8% religiosos. E vocês sabem quem é o maior comprador de livros didáticos? Isso mesmo, o Governo. E em que isso implica? Bem… Vitor Tavares, presidente da CBL, acredita, assim como eu, que obviamente os livros encareceriam para o próprio Governo, deixando-o com duas opções: ou aumentar o orçamento para comprar a mesma quantidade ou diminuir o número de exemplares comprados. Nem imagino qual será a opção que o Governo escolheria… Lembrando que os estudantes de escolas públicas dependem desses livros para ter o mínimo de uma educação de qualidade, e, certamente, uma diminuição do número de exemplares afetaria o aprendizado e a qualificação da educação.
No que se refere aos livros religiosos, a bancada evangélica vem se manifestando duramente contra a taxação, claramente em decorrência do aumento que ela acarretaria para a bíblia e demais livros religiosos. Esperemos esse embate não se paute apenas nesses livros que, como já mencionei, ficam em segundo lugar entre os mais produzidos. Taxar o demais livros e isentar os religiosos seria uma afronta ainda maior à democratização do conhecimento e criaria uma isenção extraordinária direcionada a uma parcela muito específica e sem nenhuma justificativa plausível o suficiente.
O Ministro Paulo Guedes fez um pronunciamento um tanto quanto contraditório, dando a entender que a taxação seria para atingir pessoas que tem como arcar com ela, pois os livros são consumidos pelas classes mais altas. O que não é mentira, realmente livros são quase um artigo de luxo e bastante elitizados, entretanto, taxar os mesmos sob o argumento de que quem pagaria é quem pode é, na verdade, uma desculpa esfarrapada e contraditória, na medida em que isso dificultaria ainda mais o acesso para as classes mais baixas. Porém, o Guedes pensou em tudo (tsc tsc) e disse que vai distribuir livros para os mais pobres: “Vamos dar o livro de graça para o mais frágil, para o mais pobre. Eu também, quando compro meu livro, preciso pagar meu imposto. Então, uma coisa é você focalizar a ajuda. A outra coisa é você, a título de ajudar os mais pobres, na verdade, isentar gente que pode pagar”. Engraçado (para não dizer outra coisa) é pensar quais seriam esses livros e ainda mais engraçado é que isso foi jogado no ar sem nada, nenhuma proposta concreta para respaldar.
Deixa eu contar algo para vocês, de fato, a maior parte dos consumidores de livros são de classe média e alta, todavia, na mais recente Bienal do Livro no Rio de Janeiro, que contou com a presença de mais de 600 mil pessoas, grande parte delas eram jovens da classe C. Já na FLUP, que é Festa Literária das Periferias, 97% do público se declarou leitores frequentes, desses, 51% tem entre 10 e 29 anos, 72% são de não brancos e 68% pertencem às classes C, D e E (esses dados peguei em uma matéria da folha cujo link estará nas referências). Ou seja… o argumento utilizado pelo Ministro resta bem esvaziado, pois apesar das classes mais baixas não serem as maiores consumidoras de livros elas ainda são uma parte que os consome e que vem crescendo cada vez mais e, para que isso se concretize, tributar livros não me parece o melhor caminho rs. Eu mesma só comecei a comprar esse ano, antes não tinha recursos e todos os meus livros tinham sido presentes. Agora eu posso comprar, mas não sei até quando isso será possível…
Diante de tudo que abordei, não pretendo negar que a reforma tributária é necessária, porém acredito que existam outras maneiras mais eficientes de efetuar a tributação do que taxar livros, utilizando-se da forma correta o argumento do Guedes sobre cobrar de quem pode pagar. Posso citar a título de exemplos: aumentar a taxa cobrada sobre heranças, aumento na taxação dos de fato artigos de luxo (iate, jet-ski, helicóptero, etc.), alíquotas maiores incidentes sobre o imposto de renda de quem ganha salários altos, entre outros.
Enfim, eu poderia continuar dando diversos argumentos do porque essa taxação é uma afronta à disseminação da cultura, à democratização do conhecimento, do quão prejudicial será para o mercado editorial e os consumidores, mas acredito que vocês já tenham entendido o meu ponto. Se sim, disseminem para o máximo de pessoas possível essas informações, através do blog ou não, o que importa é que mais pessoas fiquem cientes. Assinem também a petição que vai de encontro à tributação (que já conta com mais de 1 milhão de assinaturas), vou deixar o link ao final do post. Xero e até a próxima.
#DEFENDAOLIVRO
Referências
Abaixo-assinado DEFENDA O LIVRO: https://www.change.org/p/congresso-defendaolivro-diga-n%C3%A3o-a-tributa%C3%A7%C3%A3o-de-livros
Retorno da tributação sobre livros trará efeitos negativos à nossa sociedade: https://www.conjur.com.br/2020-ago-19/tobias-klen-retorno-tributacao-livros
Taxação de livros: como proposta de reforma tributária pode encarecer obras: https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2020/08/11/taxacao-de-livros-como-proposta-de-reforma-tributaria-pode-encarecer-obras.ghtml
Taxação de livros prejudicará ainda mais o mercado editorial , aponta setor: https://www.folhape.com.br/cultura/taxacao-de-livros-prejudicara-ainda-mais-o-mercado-editorial-aponta-o/151302/
Livro, artigo de luxo? Quanto custa e quanto pode custar um livro no Brasil: https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2020/08/17/livro-artigo-de-luxo-quanto-custa-e-quanto-pode-custar-um-livro-no-brasil.ghtml
Reforma tributária abre caminho para tributação de livros: https://www.conjur.com.br/2020-ago-21/nathalia-rodrigues-reforma-tributaria-tributacao-livros
A falácia de Paulo Guedes sobre a taxação de livros: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/a-falacia-de-paulo-guedes-sobre-a-taxacao-de-livros.shtml
Retratos da leitura no Brasil: https://g1.globo.com/politica/blog/matheus-leitao/post/2019/01/06/retratos-da-leitura-no-brasil.ghtml
Reforma tributária pode fazer livro ficar mais caro: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/08/11/reforma-tributaria-pode-fazer-livro-ficar-mais-caro
Deputados criticam taxação de livros na reforma tributária de Bolsonaro: https://www.topmidianews.com.br/politica/deputados-sao-contra-taxacao-de-livros-da-reforma-tributaria/133524/
Reforma tributária: Se taxar livro, governo arrecadará sobretudo com Bíblia e material didático: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/08/17/reforma-tributaria-livros-didaticos-biblia-cbs-pis-cofins.htm
Deputados criticam taxação de livros na reforma tributária de Bolsonaro: https://www.topmidianews.com.br/politica/deputados-sao-contra-taxacao-de-livros-da-reforma-tributaria/133524/
Reforma tributária: Se taxar livro, governo arrecadará sobretudo com Bíblia e material didático: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/08/17/reforma-tributaria-livros-didaticos-biblia-cbs-pis-cofins.htm
Ainda não tinha parado para entender melhor o assunto, apenas ouvido a notícia. Ficou ótimo. Valeu, Lorena!
ResponderExcluirMuito obrigada, João! Fico feliz que tenha gostado 😊
ExcluirMuito didático 👏👏
ResponderExcluirNhaa, obrigadaa 😍😍
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